sábado, 9 de novembro de 2013

Obras em multimídia 2013

Minha obra mais recente, foi realizada em computação gráfica, aquarela, pastel, desenho e fotografia tudo interagindo no mesmo espaço pictórico. Mantive uma preocupação constante em minha obra com as questões das minorias, como foi o caso de minha última exposição "Demolições"onde tratava da vida nos cortiços, mas desta vez meu foco se desloca para vários ângulos da história cotidiana da humanidade. Imagens cultuadas na memória ou no inconsciente coletivo do ser humano, que por vezes, com espírito de colecionador, revê para ter a certeza do longo caminho percorrido. Moedas antigas, fósseis, ruínas, imagens rupestres, textos, selos postais, elementos que desembaralhados podem nos dar a ilusão de certezas neste fantástico e riquíssimo mundo de embaralhamento de dados que a tecnologia digital nos brinda. Trabalhei por oito meses da prancheta ao computador e do computador à prancheta para poder encontrar a linguagem que expressasse esse universo feito de avanços tecnológicos, há poucos anos, inimagináveis e, no entanto, aínda impregnado de ícones do passado. Nada de novo, a história nos mostra que a quebra radical e absoluta com esse passado é impossível. Hoje estou começando uma série de postagens do conjunto da obra com "Memória das Pedras".

sábado, 9 de junho de 2012

Tango - sexo - tristeza

Tango a Canção de Buenos Aires de Ernesto Sábato. Tradução Beatriz Rota-Rossi Vários pensadores argentinos ligaram o tango ao sexo ou, como Juan Pedro Echagüe classificaram o tango como uma mera dança lasciva. Penso que seja exatamente o contrário. É certo que o tango surgiu no lenocínio, mas esse fato deveria nos fazer suspeitar que deve ser o reverso de uma moeda, já que a criação artística é um ato quase invariavelmente antagônico, um ato de fuga ou de rebeldia. Cria-se o que não se tem, o que de certa forma é objeto de nossa ansiedade e de nossa esperança, ou o que magicamente nos permite evadir da dura realidade cotidiana. Neste caso, a arte é similar ao sonho. Só uma raça de homens apaixonados e carnais como os gregos podiam inventar a filosofia platônica, uma filosofia que recomenda desconfiar do corpo e de suas paixões. O bordel é o sexo no estado de (sinistra) pureza. O solitário imigrante europeu que lá entrava resolvia facilmente seu problema sexual, como diz Tulio Carella: com a trágica facilidade com que esse problema se resolve nesse sombrio estabelecimento. Não era com isso que se preocupava o solitário homem de Buenos Aires, nem o que evocava em sua canção nostálgica e, por vezes, canalha. Era precisamente com o contrário: a nostalgia da comunhão e do amor, a saudade da mulher; não a presença de um instrumento de luxuria. En mi vida tuve muchas, muchas minas Pero nunca una mujer. (Em minha vida tive muitas, muitas minas, mas nunca uma mulher) Nesse contexto, o corpo do Outro é um simples objeto e o simples contato com sua matéria não propicia transcender os limites da solidão. Motivo pelo qual, o ato sexual é duplamente triste, já que não somente deixa o homem na solidão inicial, mas porque a agrava e escurece com a frustração do intento. É este um dos mecanismos que pode explicar a tristeza do tango, tantas vezes unida à desesperança, ao rancor, à ameaça e ao sarcasmo. Há no tango um ressentimento erótico e uma tortuosa manifestação de sentimento de inferioridade, já que o sexo é uma das formas primárias do poder. (...) O crescimento vertiginosos e tumultuado de Buenos Aires, a chegada de milhões de imigrantes esperançosos e, quase invariavelmente frustrados, a nostalgia da pátria, o ressentimento dos nativos contra a invasão, a sensação de fragilidade e insegurança de um mundo que se transformava vertiginosamente. Tudo isso aliado a não poder encontrar um sentido certo para a existência, a absoluta falta de hierarquias. Esse enorme universo se manifesta na metafísica tanguística. O machismo (em virtude do enumerado acima) é um fenômeno muito peculiar do habitante da cidade de Buenos Aires. Sente-se obrigado a ser macho ao quadrado ou ao cubo, não seja que num descuido, seja considerado somente macho à primeira potência. Ernesto Sabato Ernesto Sabato é ensaísta, crítico polêmico, escritor traduzido nos cinco continentes, premiado internacionalmente. Livros com várias edições em português: “Sobre Heróis e Tumbas” e “O Túnel”

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Noite de reis

“Noite de Reis” (título de um dos contos) é um livro de contos dividido em três momentos correspondentes as três cidades onde passei a maior parte de minha vida. As três cidades que contribuíram para me formar como ser humano; estribo e caldo de cultivo das histórias – Buenos Aires, Santos e Paraty
Colocando em ordem meus arquivos, percebi que eu tinha o corpo principal de mais 30 contos escritos no decorrer dos últimos 10 anos. Há dois anos, comecei a reconstrução dos mesmos. Havia, aqui e ali, lembranças autobiográficas, notas sobre comportamento humasno, linguajar, cacos de sonhos, angustia e felicidade de personagens que saiam da ficção para tomar vida própria. Escolhi dez contos dentre os trinta para serem publicados.
Vida e morte, fim e recomeço, são temas presentes nos três momentos – nos dois primeiros, Buenos Aires (a vida vista através dos olhos de uma criança) e Santos, esses binômios se apresentam de forma mais concreta, mais realista. No terceiro momento, Paraty, começo e fim se vêm confundidos como ondas interdependentes, com o improvável, com a magia da micro paisagem dessa cidade, algo difícil de acontecer na densidade urbana.

Noite de reis

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Mãe África



As crianças somalis... Precoces esqueletos. 29.000 crianças com menos de cinco anos morreram de fome nos últimos cinco anos.
Pertenço a uma geração que sonhava alto, muito alto. Íamos salvar o mundo! Naquela época era no Biafra que crianças morriam de fome. Eu recortava imagens de revistas e jornais e as guardava para mostrá-las um dia à minha filha para que soubesse como era o mundo quando ela era apenas um bebê. Estava segura (tão segura!) que a vida no futuro seria outra, afinal para isso lutávamos!
40 anos atrás! E as imagens se repetem. O mesmo grito escancarado, o mesmo olhar que pergunta: por quê?! Igualzinhos os ombros exíguos que mal sustentam a cabeça; a mesma pele enrugada e os vincos de ancião no rosto do que deveria ser um bebê risonho. Nos anos 80 cantamos “We are de world”, canção assassinada, anos depois, por uma integrante de uma das edições de um reality show, ridicularizada pela mídia. Ironicamente a participante era afro descendente.
Em vários sentidos, o Ocidente deve à África.
Quero lembrar aqui uma das dívidas.
O reconhecimento da arte africana se deu no começo do século XX, quando os artistas perceberam que estavam diante de uma nova forma de expressão, de liberdade de criação e de análise formal. O Cubismo de Picasso e Braque, Gris, Léger e outros, a arte mais cerebral do Século XX, inicia sua escalada com o quadro alucinante “Les Demoiselles d´Avignon” (1907) de Pablo Picasso, o primeiro quadro moderno de nosso tempo. Nessa obra, a influência das máscaras negras é definitiva. A escultura africana ensina a Picasso como deformar os corpos para criar uma estrutura homogênea entre as massas, inventando novas formas, como as dos artistas do Continente Negro.
Não somente o Cubismo, Fovismo e tantos “ismos” do começo do século XX, têm um débito com a arte africana, mas a música de Stravinskij, Prokofiev e Bartock.
Mas se houve por parte dos artistas europeus o reconhecimento do valor artístico da arte africana, não houve um aprofundamento sobre seu significado. As máscaras estão nas entranhas das cerimônias religiosas, casamentos, nascimentos, decisões bélicas, funerais, ritos de iniciação e cura de doentes. A máscara é uma “persona” mística que pode dar, a quem a usa, poderes que sem ela não teria. O artista que as produzia também usava uma máscara enquanto realizava a tarefa. Afastava-se dos povoados e adentrava na mata cumprindo uma série de rituais. A pureza do artista enquanto trabalhava era condição indispensável para o bom resultado da empreitada. Uma vez realizadas as obrigações e empunhada a faca para esculpir, tinha liberdade absoluta para criar.
As máscaras não são objetos de decoração ou curiosidade para serem espalhadas como elementos decorativos das residências. Quando colocadas nessas condições, acusam a ignorância e o desrespeito da cultura branca materialista pela cultura do sagrado.